quinta-feira, 5 de junho de 2008

as palavras que disparaste mataram-me o amor

as palavras saiam-te da boca sem pensares, entupiam os buracos num caminho onde caíamos, estatelavam-se num chão de abraços que não se davam e eu sentada na borda da estrada chorava o silêncio entalado na garganta. o rosto contraia-se nos tantos sorrisos que nunca conheceu, a boca perdia-se em gemidos breves de palavras nada leves que agitam e redemoinham as árvores em redor. onde vais? tu calaste com o coração entalado entre os dedos das mãos que de um lado para o outro se agitam num corpo que não corre, anda desenbaraçadamente sobre a corda bamba da pressa desalinhada. onde vais? e tu calaste com os olhos postos sobre a linha do horizonte onde o sol tombava por detrás das montanhas, tu calaste depois de teres soltado uma tempestade de palavras que agitava a tarde calma. a neve dos teus passos, o outono dos teus braços, a primavera dos teus sorrisos, o verão dos teus gestos, as estações desaparecem e agora não te sei dizer que tempo está ou que tempo faz. foste. havia um mundo antes de partires, um mundo enlameado mas um mundo inteiro que quebrava e quebrava tão devagar como desaparecia na ténue e súbtil fronteira entre o que temos e aquilo que gostavamos de ter. e tu riste quando te pedi um abraço, pensavas que um abraço não se pedia dava-se mas eram poucas ou nenhumas as vezes que o davas, riste da minha cara onde morava uma expressão de carência que nunca me conheceras. deixo-te rir enquanto me olho com o peito cheio de ar e uma bomba na barriga prestes a explodir. apesar de doer deixo-te rir e rio-me contigo da minha pequenês e daquela grandiosidade que nunca em ti descobriras. as palavras saiam-te da boca sem pensares, entupiam os buracos num caminho onde caímos, estatelavam-se num chão de abraços que não se davam e eu sentada à margem de um rio de lágrimas murchava como uma flor desamparada num descampado onde o sol incide. a tua face pinta-se de cal e o teu olhar cospe um perto que já não se sabe, rasgas-me as páginas escritas de palavras que não quis ouvir? faz de mim o diário que queimaste quando ela te deixou, faz de mim as fotos que queimaste quando ela te traiu com o teu melhor amigo, faz de mim as músicas que nunca mais ouviste, a casa que abandonaste, hoje eu sou. e essas palavras saim-te da boca sem pensares e queimavam as pontas dos meus dedos dos pés, devagar, fiz-me cinza, fiz-me morte. cravo as unhas num presente que nunca foi, haveria de ter sido se os teus paços não se ouvissem de tão longe, o teu corpo deita-se no sofá e eu a uns metros de ti, os pés seguram-me o corpo que balança para a frente e para trás, eu não te ouço respirar, não te vi chegar. não me sentes, não te voltas, os olhos ainda pensam nela, ainda a fotografam na carpete da sala e eu volto para a cozinha e acabo o jantar.
as palavras saiam-te da boca sem pensares, quebravam a loiça, arrastavam a toalha, enchiam a cozinha de gritos e sobre a mesa pintavam um rosto em tinta permanente. levantei-me e saí, chorava o silêncio entalado na garganta.

por: mar


7 comentários:

Anonymous Anónimo escreveu...

olá margarete.
tenho acompanhado o teu blogue e vejo q tens crescido em todos os sentidos.
pessoa e poético
um beijo.

6 de junho de 2008 às 17:25 
Blogger Eduardo Franco escreveu...

Muito bem Margarete.Gostei!Mas vamos ser mais positivos!Porque o amor nao morre!Sao como as ondas do mar...Ninguem sabe de onde veem ou o que trazem.So uma coisa e certa vao e voltam.Tanta coisa que se podia dizer mais nao e?Deixo isso para ti.Beijos.(www.escritacriativa.com, escrevo.org - Dadof - Se calhar ja nos encontramos pelos caminhos karmicos e dai que nos conhecemos. ;))

7 de junho de 2008 às 04:25 
Blogger Irene Ermida escreveu...

Não há retrocesso para as palavras ditas! Ecoam no nosso pensamento e ferem-nos.
Por vezes é preferível «chorar o silêncio entalado na garganta» do que dar resposta.
Adorei este post. Senti-me muito perto das tuas palavras.
Bjs

7 de junho de 2008 às 19:51 
Blogger Carlos escreveu...

«onde morava uma expressão de carência que nunca me conheceras. deixo-te rir enquanto me olho com o peito cheio de ar e uma bomba na barriga prestes a explodir. apesar de doer deixo-te rir e rio-me contigo da minha pequenês e daquela grandiosidade que nunca em ti descobriras»


de certo modo a pequenês, nas suas variadas vertentes não deixam sentir ou sequer entender a generosidade .....

como sempre gosto.... visitar-te

beijo

8 de junho de 2008 às 02:19 
Blogger (Un)Hapiness escreveu...

ja tinha saudade de te ler...:)

nem sempre medimos bem as palavras q dizemos...o amor, esse, terás sempre...apenas mudará de tom :)

kiss

9 de junho de 2008 às 13:25 
Blogger --------------- escreveu...

Mais importante que as palavras proferidas é modo como as recebemos e se não mandamos em quem as diz, podemos escolher o modo como as recebemos e como lhe atribuímos mais ou menos significado...:)

9 de junho de 2008 às 18:41 
Anonymous Anónimo escreveu...

Sabes... li e adorei, como poderia não gostar?
Há apenas um pormenor; Não sei como comentar, fico sempre sem palavras para comentar o que escreves, ou seja, simplesmente profundo.
A tua sensibilidade é transportada para a escrita e sentida de uma forma muito profunda por ti, mas também por quem te lê.
Um beijo.

10 de junho de 2008 às 16:58 

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