quinta-feira, 4 de junho de 2009

supostamente nascemos da mesma flor e é nosso o mesmo destino do pólen. supostamente somos do vento e é ele que nos leva daqui para ali, vamos-lhe no dorso, tão atabalhoadamente sentados que lhe doemos ao fundo das costas, somos pesados, é o chumbo de dois corações num só. respiramos a dor enquando vamos, e vamos por tantos lugares que eu nem sei se já aqui estivemos. espera. julgo que sim, lembro o caminho ao longe a pender nas casas de telhado baixo, lembro a senhora velha com um cesto à cabeça, lembro o mar bravo e as gaivotas junto dele, foi aqui que perdeste a virgindade. e de súbito desprendes-te das mãos, as minhas mãos seguras nas tuas, voas, vais sentar-te a poente, onde não dói ao vento e eu fico só.

por: mar

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nesta inocência aborígene construímos uma queda. as quedas são como flores fora de estação, por isso doem, não se acomodam, não nos pertencem. de todas as quedas a mais dolorosa é esta, do alto do monte erguer os braços sobre o penhasco e cair, como se fosse fácil derrubar o peso de um corpo sem ossos. construímos a queda de quase nada ou de quase muito, há quedas que são nomes ditos em simultâneo, vogais dispersas como chuva diagonal. há nomes que não são quedas, nomes curtos onde as vogais se aconchegam umas às outras, como segredos ditos ao cair da tarde numa jura de amor. quero o teu nome em queda livre sobre o meu.

por: mar

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quarta-feira, 3 de junho de 2009

há dois braços do lado de fora do corpo à espera.

na inexactidão dos gestos fico-me a tentar, insistentemente, percorrer caminhos que não me pertencem; talvez por pensar que tão curta é a vida como curta é a nossa floresta de afectos. por certo acredito ser possível mudar o tempo, inverter o espaço, vestir de flores o inverno, chover abraços. e também por certo hei-de morrer de mãos vazias, curvada sobre o peso do coração; ainda assim é em noites como esta que sofro a aparição do teu sorriso, alado do mundo . é preciso não pertencer a lugar nenhum para entender que o mundo inteiro nos habita, é preciso ser-se primeiro o mundo inteiro e só depois ser-se apenas um. eu sou apenas um acto, multiplicado sobre a força do movimento de um par de braços a envolver um corpo, ou uma memória contínua e persistente.

por: mar

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