domingo, 3 de agosto de 2008
antónio
de todas as esperas faço um pé de meia que guardo numa caixa coberta de pó no sótão. quando o gato mia tiro um sapato para lhe atirar e ainda com uma dor qualquer a servir-me de companheira, atiro-lhe com a agulha. e a vida sem ti devia ser sempre assim, um atirar de agulhas a pêlo de gato que mia assustado.
o relógio da sala comeu as horas quando morreste e a tua morte, antónio, foi a morte de todos os quadros das paredes. no bule o chá arrefece.
e os meus dedos procuram-me o peito para me tapar um buraco vazio, toda a falta que me fazes! cresço sempre muito quando me levanto e já na janela assisto ao descer do sol, a trajectória de sempre que agora tu, meu velho e morto marido, não podes ver. apago as luzes e espero com as mãos embrulhadas no avental. hão-de haver dias e dias atrás deste fim de tarde,
dias e dias em que a tua voz não me chega da cozinha, em que o chá não aquece e o gato ainda mia, o gato ainda mia e eu, agora, sem agulhas para lhe atirar.
8 comentários:
Mar
Depoi de me debruçar sobre o texto, a minha interpretação é assim:
- "Mau Maria, que o gato mia"!...
Daniel
tu escreves coisas bonitas mar *
Escreves tão mas tão bem minha querida :')
«3 O maior dos maiores afectos, a maior das maiores ternuras.
Os teus textos são sempre profundos e eu fico comovida.
Quantos Antonios partem e deixam as suas mulheres assim...num vazio...
Beijo
a viúva, o gato e a solidão. sempre grandes linhas tecidas com saudade ;)
*
Este comentário foi removido pelo autor.
Adoro o emaranhado altamente ordenado e imensamente sentido dos teus textos!
Admiro de longe a tua escrita e escrevo também eu.
Atirando antes vocábulos às mentes conscientes, também com o intuito de lhes acertar e com eles despertar a sua atenção.
Parabéns!
R.C.
e volto. volto às tuas letras porque são como uma poção encantada. escreves maravilhosamente.
um beijinho doce menina.
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