sábado, 25 de outubro de 2008
apagas a luz e escondes-te atrás da cortina, olhas a rua pelo mesmo lado, o teu, mais sombrio, onde a casa se aninha sobre os passos vagarosos da madrugada. do outro lado da praça, a despertar de outro qualquer estado de apatia o soalho range os pés descalços, molhados como o corpo enrolado na toalha fria. o outro despe o casaco e atira-se de encontro à cama onde os lençóis desfeitos maltratam a madrugada que espera calada ao cimo de qualquer objecto. há qualquer coisa a prender a aragem, uma inquietude que chama do fundo do guarda-vestidos e empurra a cómoda contra o teu peito, memórias em forma de fotografias e recados e palavras que te chegam de longe. quando te ensinaram a andar tinhas dois anos já e os pés de tão tortos gastavam os dedos contra o asfalto. ele espera que as paredes empurrem a cama mais para o canto, onde a luz não chega é mais fácil adormecer. há quem ajeite a almofada contra o pescoço tosco a desprender-se de um corpo murcho. que horas são não sabes, há muito que perdeste as horas entre as tantas palmas que te proibiram a passagem. litros de sangue a correr banca abaixo e o ensurdecedor ruído da batedeira. ele ergue-se com o coração aflicto. especado em frente à casa o homem deixa as mãos enterrarem-se-lhe no bolso. dez horas menos dois ou três quartos da casa na outra rua e a puta é esfaqueada.
4 comentários:
Este comentário foi removido pelo autor.
já alguém sabia que ía acontecer, mas a vila permanece no silêncio de quem dorme um sono profundo, imperturbável.
só lá no fundo do beco alguém se impacientava entre as quatro paredes, o ar a fugir dentro das quatro paredes, os suores frios a consumir o cérebro, a consumir o sossego, a consumir a própria vida.
porque é que todos os dias morrem anjos e nunca são suficientes?
quantas mais mortes? quantos mais cabeças contra uma parede?
Mar,
Continua o seu sortilégio crítico ao mal amado quotidiano, onde diariamente acontecem coisas da maior desigualdade impensada. Esses distúrbios que pela ecludem, esse maltratar, sem olhar a meios, que no dia seguinte ouvimos pelas notícias...esse bater e fugir...
Mar,
Já lhe disse por escrito 8mais do que uma vez) que escreve de uma forma acima da médio (aliás muito acima) e gosto imenso de a ler.
Mas, concluo que por mais que a possamos ler, talvez, menos a conheçamos. Todavia, isso não interessa. Aqui o predominante é o texto, são as palavras é o conteúdo daquilo que escreve e isso é simplesmente fabuloso.
Mar,
Vou continuar a tentar lê-la, sempre, e sempre que o tempo disponível o proporcione...e para o que produz, neste âmbito, tem de haver sempre tempo...
Beijos
Até sempre...
António M.R.Martins
alfa zema, tentei ir ao seu blogue mas foi-me barrado o acesso, na eventualidade de ver este comentário peço-lhe que abra as portas do seu mundo ao meu mar.
abraço
deste
mar.
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